quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

"Amor de Perdição", por Juliana Gemelli da Silva


“Amor de Perdição” foi escrito por Camilo Castelo Branco e publicado em 1862 e faz parte da escola literária chamada de ultra-romantismo de Portugal, ou seja, a segunda fase do romantismo nesse país. Os escritores dessa fase usavam a características do romantismo exageradamente. Podemos dizer que “Amor de perdição” é um Romeu e Julieta português, pois as histórias são semelhantes. Camilo Castelo Branco foi um escritor muito conhecido, mas tornou-se mais ainda com as novelas passionais que escreveu como essa. “Amor de Perdição” é uma das obras onde podemos nos questionar se a arte imita a vida, para entender porque essa questão encaixa-se aqui é necessário que conheçamos o enredo da história. Ela é dividida em introdução, mais vinte capítulos e conclusão.Na introdução o narrador já nos conta que o protagonista morre por amor. Nos próximos capítulos ele nos informa sobre a história da família de Simão. Inicia contando que Domingos Botelho, pai de Simão, era formado em Direito trabalhava em Lisboa e apaixona-se por D. Rita, que, pelo que pude entender, era uma dama de companhia da rainha e casa-se com ele por vontade da rainha e não por amá-lo. Após o casamento eles têm cinco filhos e um deles, é Simão. A partir daí a obra conta a estória do amor impossível entre Simão Botelho e Teresa de Albuquerque, pois suas famílias eram rivais. Quando o romance entre os dois é descoberto Simão é enviado para Lisboa e o pai de Teresa tenta casar ela com seu sobrinho.Teresa não aceita casar com o primo, o que foi uma atitude ousada para a época, já que ela vivia em uma sociedade patriarcal onde as mulheres não podiam aspirar nada, com isso, seu pai teve o orgulho insultado e após ameaçar muito, envia ela para um convento. Lá descobre que os conventos não são lugares puros como pensava, descobre que as freiras fazem maledicências, tem vícios, vida sexual e disputam pelo poder. Contudo, uma das freiras a ajuda a mandar cartas para Simão.
Simão retorna para Viseu para resgatar sua amada e hospeda-se na casa do ferrador. Lá é cuidado pela filha do homem, que se apaixona por ele. Mariana, mesmo apaixonada, ajuda Simão a mandar cartas para Teresa.
Quando Simão descobre que Teresa será destinada para outro convento, ele decide seqüestrá-la e acaba assassinando Baltasar. Simão é preso e Teresa vai para outro convento. Mariana continua cuidando de Simão na cadeia e quando ele é enviado para a Índia ela vai junto com ele. Teresa vê o barco de Simão ir embora e morre. Simão sabendo que ela morreu também falece. Quando seu corpo vai ser jogado no mar, Mariana agarra-se ao cadáver e morre também.
Após conhecer o enredo da obra, devemos conhecer a biografia de Camilo Castelo Branco para assim traçarmos paralelos entre as duas.
Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco nasceu no dia 16 de março de 1825, em Lisboa, na freguesia dos Mártires, em um prédio na Rua do Rosa. Era filho de Manuel Joaquim Botelho Castelo Branco e de Jacinta Rosa do Espírito Santo. O pai de Camilo nasceu em vila real de trás-os-montes, em 1778.Estudou em Coimbra com seu irmão Simão Botelho, esse seu irmão tinha um gênio difícil assim como o Simão da obra. Manuel foi para a Cavalaria, assim como o Manuel da obra. O pai de Camilo envolvia-se em fraudes e era preso, mas era solto, pois seu pai era muito influente.Alguns dizem que viveu com Jacinta e após a morte dela viveu com uma meretriz. Enfim, seus filhos tiveram muitas madrastas, pois ele viveu com muitas mulheres durante sua vida.Manuel morre no dia 22 de dezembro de 1835, alguns dizem que de cólera, outros que morreu de louco.Os motivos das mortes nessa época não podem ser levados muito em conta, acredito que o conhecimento que se tinha sobre o corpo humano era pouco e o senso-comum dominava a população, pois acho muito sinistro uma pessoa morrer de "congestão cerebral", motivo que a tia de Camilo disse ter sido a morte de seu pai.Camilo tinha 10 anos quando seu pai faleceu.Após a morte do pai Camilo e sua irmã Carolina Rita Botelho Castelo Branco mudam-se para a casa da tia, o ambiente familiar era totalmente desregular assim como eles já estavam acostumados, Camilo não teve laços afetivos muito fortes na família, e na infância caminhava ao redor da vizinhança e observava as pessoas.A tia com quem foram morar chamava-se Rita (Preciosa) da Veiga Castelo Branco, tinha poucas virtudes se pensarmos no comportamento que teve com os sobrinhos, era ambiciosa e sem escrúpulos, fez de tudo para ficar coma herança das crianças e cobrou quantias enormes para cuidar deles. Foi a tia Rita que contribuiu para o pensamento fatalista de Camilo, dizia a ele que ele não podia fugir do destino da família, que geralmente era uma tragédia.Quando tinha 16 anos conhece Joaquina Pereira de França e em 1841 casam-se, com ela teve uma filha chamada de Rosa, após o nascimento da criança Camilo abandona Joaquina e encaminha-se para Lisboa matriculando-se no curso de medicina. Depois em “Amor de Perdição” Camilo comenta que "o amor aos 15 anos é uma brincadeira; é a ultima manifestação do amor às bonecas". Com certeza escreve isso se inspirando no seu casamento precoce com Joaquina. Assim como seu pai, Camilo foi um homem de muitas mulheres, matriculado no curso de medicina preferia os bares a sala de aula o que causa sua reprovação no curso, na obra Simão também perde o ano por faltas. Mais ou menos nessa época nosso D.Juan conhece Patrícia Emília, apaixona-se e foge com ela para Coimbra em 1846, são então presos na Cadeia da Relação do Porto, pois Camilo ainda era casado com Joaquina, após saírem da prisão continuam a encontrar-se até que um dia Patrícia engravida e da a luz a filha deles chamada Bernardina Amélia, novamente após o nascimento de uma filha Camilo abandona a mulher e vive com uma freira que cuidou da filha que ele teve com Patrícia, acredita-se que as informações contidas nas obras de Camilo sobre conventos venham da relação que teve com essa freira, pois após separar-se dela continuam amigos.Segue com sua vida nos salões de festas e foi em uma destes salões que conhece o maior amor de sua vida, a mulher fatal, uma jovem de 19 anos chamada Ana Augusta Plácido, mas ela estava prometida pelo seu pai a um mercante rico e tem de se casar com ele. Ana nunca escondeu que amava Camilo, tanto dizia que seu marido achou melhor colocá-la em um convento por certo tempo, depois teve um filho com seu esposo, mas, muitas pessoas acreditam que o progenitor da criança foi Camilo. Enquanto isso Camilo vive como um nômade, até o dia em que volta a viver em Porto e tem contato direto com Ana, certo dia ela abandona o marido e passa a viver com Camilo, são então perseguidos e presos por adultério, Camilo ficou na cadeia por um ano e 15 dias, foi preso que escreveu “Amor de Perdição” e também foi na prisão que apareceram os primeiros sintomas da cegueira causada por uma sífilis mal curada.Em 15 de outubro de 1861 o casal é absolvido e solto, vivem juntos tem um filho chamado Jorge que terá problemas mentais. Em 1864 nasce Nuno, o ultimo filho do casal e que também só deu desgosto aos pais. Após ser nomeado visconde, Ana e Camilo casam-se legalmente, já não nutrem mais o mesmo amor da mocidade. Camilo passa por necessidades financeiras e torna-se o primeiro escritor português a escrever por encomenda, mas a visão começa a piorar e termina ficando cego. Então se suicida com um tiro no ouvido por saber que um romântico não deve esperar a morte natural que vem com a velhice. Foi o maior representante do ultra-romantismo português. As características dessa fase romântica são retratadas fielmente nessa obra, onde os personagens vivem, morrem ou, como diz o titulo, perdem-se, tudo em nome do amor.
Conhecendo a vida de Camilo e a obra “Amor de perdição” conseguimos observar que muitos pontos coincidem, não que sua obra tenha sido baseada como um todo em sua vida, mas ele soube pinçar algumas coisas e usá-las na história. Jamais podemos dizer que sua obra ou um de seus personagens são seres reais, trata-se de uma ficção baseada em alguns fatos reais, se compararmos os personagens de “Amor de Perdição” com as classificações que Antonio Candido faz, podemos dizer que existem personagens baseados em pessoas com quem o autor conviveu, personagens baseados em pessoas reais, que o autor trabalha subjetivamente, mas todos são personagens ficcionais e não reais.
Tendo já observado as semelhanças entre a vida e obra do autor, podemos ir mais longe, e notar que ele ao contar essa estória, faz críticas a sociedade da época e principalmente aos conventos. Quando na estória o pai de Tereza usa o convento como um lugar onde ela poderá ficar longe do contato com Simão e terá uma educação privilegiada, o que não acontece, pois lá ela consegue manter a comunicação com Simão e ainda descobre que a vida entre as freiras é cheia de vícios, depravações, lutas por poder e intrigas. Sabe-se que, nessa época, as mulheres viviam em uma sociedade patriarcal onde não tinham querer, e seus pais, às vezes até os maridos, enviavam-nas para conventos, muitas vezes as colocavam em conventos por simples ostentação. ”Amor de Perdição” acontece por volta de 1800, ao pesquisar sobre conventos encontramos que, mais ou menos desde 1500, algumas mulheres escolhiam viver em conventos, pois assim podiam ter mais liberdade intelectual e sexual do que se vivessem fora deles. Nessa época, a maioria das mulheres era carente de educação escolar e as que sabiam ler tinham os livros censurados por seus maridos. Ao entrarem para o monastério podiam levar uma vida social, cultivar a arte e administrar seu próprio dinheiro.Os conventos daquela época não tinham muito a ver com os de hoje, sendo que as freiras não faziam voto de pobreza, não eram proibidas de se encontrarem com outras pessoas. Elas até tinham direito a escravas e alguns de seus quartos eram forrados com lâminas de prata e ouro. Até que um dia a igreja tirou esses privilégios das freiras, mas graças a essas vantagens tivemos três grandes freiras escritoras são elas: Leonor de Ovando, Juana de Maldonado e Juana Inés de la Cruz.
Camilo não foi o único a retratar a vida real dos conventos. Florentino Bocaccio, escreveu “Decameron”, onde seus personagens reunem-se em uma casa e contam histórias satirizando a igreja. E em uma das histórias um de seus personagens conta a de um jardineiro que se finge de mudo para conseguir um emprego em um convento, conseguido o ofício, o mudo tem relações com todas as religiosas. Acusaram Bocaccio de heresia e ele teve de fugir e se isolar.
Mais contemporâneo a nós, encontramos José Saramago criticando a vida monástica em sua obra “Memorial do Convento”. Na obra, ele critica os dogmas da igreja, a influência que ela tem sobre o povo e como suas decisões estão sempre ligadas ao dinheiro. Além de favores comerciais deixa claro a promiscuidade das freiras e a injustiça e crueldade dos tribunais da Inquisição, relatando-nos que as freiras trocavam favores sexuais com os reis. Relata também o comportamento promíscuo dos frades com suas amantes.
Todas essas críticas, comprovam a hipocrisia da igreja católica, que cobrava absurdos de seus fiéis, no entanto nem, seus representantes seguiam suas regras.
Observamos então que a obra de Camilo pode ser explorada em vários aspectos. Aqui resolvi apontar mais as críticas aos conventos pois foi o que mais chamou minha atenção, mas é possível notar em toda a sua obra os costumes da sociedade burguesa. Ele também retrata muito bem também como as mulheres viviam naquele tempo e como era vistas como seres inferiores.



REFERÊNCIAS
http://www.mundocultural.com.br/index.asp?url=http://www.mundocultural.com.br/literatura1/romantismo/camilo.htm. Acesso em: 25/11/2007, 18:25:14

http://www.defatima.com.br/site/conteudo/novidades/artigomensagem.htm. Aceso em:25/11/2007, 14:15:45

http://historia.abril.com.br/2006/edicoes/personagens/mt_212581.shtml. Acesso em: 27/11/2007, 15:32:58

http://almanaque.folha.uol.com.br/sergiobuarque_patriarcal2.htm. Acesso em: 26/11/2007, 16:45:54

http://rosabe.sites.uol.com.br/romant.htm. Acesso em: 28/11/2007, 02:45:00

http://pwp.netcabo.pt/0511134301/camilo.htm. Acesso em 28/11/2007, 04:00:00

http://www.citi.pt/cultura/literatura/romance/c_castelo_branco/pro_desam.html. Acesso em: 26/11/2007, 16:47:12

http://w3.ufsm.br/grpesqla/revista/num08/art_05.php. Acesso em: 27/11/2007, 14:45:14

BRANCO, Camilo Castelo. Amor de Perdição.21a ed.São Paulo:Ática,1995

CANDIDO,Antonio. A PERSONAGEM DE FICÇÃO.2aed. São Paulo: Perspectiva
NICOLA, José de.Introdução e comentários IN BRANCO, Camilo Castelo Amor de Perdição. São Paulo.Scipione, 1994



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