segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Análise do conto "O soldadinho de chumbo"

FLÁVIA MUSSI ALVIM WINTER
LEANDRO RODRIGUES VIEIRA
NATÁLIA ALBERICI ARRAIS
PAULO RICARDO CHRISTOFOLI
Se esperamos viver não só cada momento, mas ter uma verdadeira consciência, nossa maior necessidade e mais difícil realização será encontrar um significado em nossas vidas."
Bruno Bettlheim
Ao iniciarmos este trabalho de análise do conto O Soldadinho de Chumbo, de Hans Christian Andersen, não tínhamos dimensão da importância e dos significados dos contos de fadas e sua capacidade em abrir novos horizontes ao leitor infantil.

Mesmo que implicitamente, a criança ao entrar em contato com esses textos vai absorvendo valores essências para sua formação e encaixando peças, como eu um quebra-cabeça, determinantes para seu futuro caráter e enfrentamento diante as adversidades que a vida lhe apresenta.

Bruno Bettelheim, em seu livro “A Psicanálise dos Contos de Fadas”, diz:

Esta é exatamente a mensagem que os contos de fada transmitem à criança de forma múltipla: que uma luta contra dificuldades graves na vida é inevitável, é parte intrínseca da existência humana – mas que se a pessoa não se intimida mas se defronta de modo firma com as opressões inesperadas e muitas vezes injustas, ela dominará todos os obstáculos e, ao fim, emergirá vitoriosa (BETTELHEIM, 2002, p.6).

No decorrer deste trabalho, tentaremos dar uma idéia, mesmo que superficial, da importância do conto de Hans Christian Andersen na formação do leitor infantil, analisando sua simbologia e significados, demonstrando que os valores constantes na obra ultrapassam o tempo, o espaço, vindo ao encontro com conflitos tão presentes no mundo contemporâneo.


BIOGRAFIA DE HANS CHRISTIAN ANDERSEN

Hans Christian Andersen nasceu no dia 2 de abril de 1805, em Copenhagen, vindo a falecer em 4 de agosto de 1875.

Filho de lavadeira e sapateiro, aprendeu a ler desde muito cedo e adorava ouvir as histórias contadas por seu pai. Nasceu numa época em que a Dinamarca estava se voltando aos valores nacionalistas e descobrindo seus valores ancestrais. De certa forma graças à sua infância pobre, Andersen teve a chance de conhecer os contrastes de sua sociedade, o que influenciou bastante as histórias infantis e adultas que viria a escrever quando mais velho. É considerado o pai da literatura infantil e juvenil universal.

Em 1816, seu pai morreu e ele, com apenas onze anos, precisou abandonar a escola, mas já nessa época demonstrava aptidão para o teatro e a literatura. Criou uma espécie de teatro de brinquedos e apresentava peças clássicas.

Aos catorze anos, saiu de casa e foi para Copenhagen, onde conheceu o diretor do Teatro Real, Jonas Collin. Anderson trabalhou no teatro como ator e bailarino, além de escrever algumas peças. Em 1828, entrou na Universidade de Copenhagen publicando diversos livros, mas só alcançou o reconhecimento internacional em 1835, quando lançou o romance O Improvisador.

Contudo, apesar de ter escrito diversos romances adultos, livros de poesia e relatos de viagens, foram os contos de fada que o tornaram famoso. Especialmente pelo fato de que, até então, eram muito raros livros voltados especificamente para crianças.

Ele foi, segundo estudiosos, a primeira voz autenticamente romântica a contar histórias para as crianças e buscava sempre passar padrões de comportamento que deveriam ser adotados pela nova sociedade que se organizava, inclusive apontando os confrontos entre poderosos e desprotegidos, fortes e fracos, exploradores e explorados. Ele também pretendia demonstrar a idéia de que todos os homens deveriam ter direitos iguais.
Entre 1835 e 1842, Andersen lançou seis volumes de Contos, livros com histórias infantis traduzidos para diversos idiomas. Ele continuou escrevendo seus contos infantis até 1872, chegando à marca de 156 histórias. No começo, escrevia contos baseados na tradição popular, especialmente no que ele ouvia durante a infância, mas depois desenvolveu histórias no mundo das fadas ou que traziam elementos da natureza.

Alguns contos importantes do autor:

A Nova Roupa do Rei – 1829
O Isqueiro Mágico – 1835
A Pequena Sereia – 1836
O Soldadinho de Chumbo – 1838
O Patinho Feio – 1843
A Pequena Vendedora de Fósforos – 1846


ESTRUTURA BÁSICA DO CONTO

O cenário inicial do conto nos remete para uma situação de dificuldade e restrição do herói pelo fato de ter apenas uma perna. Porém existe o sentimento de superação dessa diferença descrita no texto na passagem: “Mas ele ficava tão bem de pé, numa perna só, como os outros nas duas” (ANDERSEN, P.152).

Os conflitos estão presentes durante basicamente todo o conto. As diferenças sociais, situação essa impregnada na Dinamarca do século XIX, em que as constantes guerras enfraqueciam as finanças e aumentavam os contrastes entre a plebe e a nobreza, também estão presentes, situação essa evidenciada no trecho:
“ Esta seria uma mulher ideal para mim. Mas é muito aristocrática, mora num palácio, e eu tenho apenas uma caixa de papelão, onde somos vinte e cinco” (ANDERSEN, P.153).

O elemento do sobrenatural é carregado pela presença do Duende e como se fosse a voz dessa sociedade de classes diz para o Soldadinho que a bailarina está acima dele. “Soldado de Chumbo! – disse o duende. – Tira os olhos de lá!” (ANDERSEN, P.154).

Ocorre uma ruptura quando o herói sai da proteção e mergulha no completo desconhecido. Nesse momento as aventuras vividas pelo Soldadinho fazem aflorar seu sentimento de amor e perseverança diante as diversas dificuldades enfrentadas no transcorrer do conto.

O confronto e a superação desses obstáculos e perigos, busca soluções no plano da fantasia com a introdução de elementos imaginários.

O enredo segue linear e o processo de solução dá-se pela passagem que leva o soldadinho a ser encontrado dentro do peixe e, por uma dessas reviravoltas do destino, o soldadinho vê-se novamente diante da bailarina.

O desfecho remete-nos a um final apoteótico na qual o soldadinho e a bailarina se fundem em um só coração dando assim a sensação da transformação em algo novo.

SIMBOLOGIA DO CHUMBO

Símbolo do peso da individualidade incorruptível. Para a transmutação do chumbo em ouro, os alquimistas buscavam simbolicamente desprender-se das limitações individuais, para atingir os valores coletivos e universais.

O chumbo simbolizaria a matéria, enquanto está impregnada de força espiritual e a possibilidade das transmutações das propriedades de um corpo nas de um outro, assim como das propriedades gerais da matéria em qualidade do espírito. O chumbo simboliza a base mais modesta de onde pode partir uma evolução ascendente.

Essas características citadas acima estão muito presentes no conto O Soldadinho de Chumbo, principalmente em seu final quando há uma transformação do Soldadinho e da bailarina em um coração.


ANÁLISE DO CONTO

O conto O Soldadinho de Chumbo foi o primeiro escrito totalmente por Andersen. O conto trata de um grande amor entre o Soldadinho de Chumbo e a Bailarina e durante sua narrativa aponta situações precárias da vida.

O conto não traz a tona apenas o sentimento de amor, pois trata de ética, diferenças culturais, identidade e aceitação das diferenças.

No conto, Andersen utiliza-se da animação de objetos, como os brinquedos, para representar a impotência das crianças, incompreendidas e cheios de desejos que ninguém escuta.

Andersen tinha uma visão do amor platônica e muitas vezes mortal, levando-nos a pensar que ele encontrou beleza nas palavras, mas nem por isso teve recompensas no campo do amor.

Na passagem do conto em que o soldadinho é engolido por um peixe e depois retirado da sua barriga, podemos fazer uma analogia com a gestação, um renascer para uma nova oportunidade uma vez que por obra do destino foi parar exatamente no mesmo lugar de onde havia saído.

A morte do soldadinho e da bailarina não deve ser encarada como uma tragédia, mas sim como uma transformação, pois é nesse momento do conto, e somente nesse momento, que os dois conseguem ficar unidos. Da união dos dois surge um coração significando o amor pela eternidade. Essa transformação que ocorre pode estar relacionada também com a simbologia do chumbo na qual esse elemento é considerado a base mais modesta de onde pode partir uma evolução ascendente.

Abaixo uma análise, publicada na Zero Hora em 02.04.2005 de Diana e Mário Corso em “A infância invade o conto de fadas”.

Por isso, não surpreende que o Soldadinho de Chumbo seja uma história de amor infeliz. Trata-se de soldadinho diferente, pois lhe falta uma perna. Em função disso, apaixona-se por uma bailarina de papel, cuja perna erguida faz parecer que ela também tem apenas uma.Fascinado pela amada, coloca-se num lugar desde onde possa contempla-la e deixa de ser guardado com seus irmãos. Em função disso, o soldadinho sofre inúmeros revezes, cai da janela, é colocado a navegar pelos esgotos num barquinho de papel e termina na barriga de um peixe que, para seu grande espanto, é comprado pela cozinheira da casa onde morava. Mas nem essa virada da sorte propicia o amor impossível dos dois: somente na morte, queimando juntos, derrubados na lareira eles finalmente se fundirão.
Como o soldadinho e a bailarina, as crianças estão à mercê de serem levadas para onde forças superiores quiserem. Devemos lembrar que é bem recente a idéia de consultar uma criança a respeito de se ela quer ou não ir a determinado lugar ou se está sentindo-se bem onde está. Nos tempos da infância de Andersen, crianças morariam como, quando e com quem fosse disposto que deveria ser, e pouco importava o que achassem disso. Além disso, seus sentimentos não passavam de secretas fantasias e ilusões, que o mundo ignorava solenemente(CORSO, 2005).

CONCLUSÃO

Após proceder a leitura e análise do conto O Soldadinho de Chumbo, podemos entender um pouco sobre a importância desse tipo de texto na formação da criança.

Mais que apenas uma história, esse conto nos faz refletir sobre temas atuais como integração, amor, persistência, coragem e finalmente capacidade de enfrentar as adversidades que nos são impostas no dia-a-dia.

Esse conto foi escrito por Andersen em 1838, mas o seu conteúdo universal se atualiza pelos anos.

Como Bruno Bettelheim escreve em sua obra A Psicanálise dos Contos de Fada:

Aí temos uma das múltiplas verdades reveladas pelos contos de fadas, que podem orientar nossas vidas: uma verdade tão válida hoje em dia como nos tempos do “era uma vez” (BETTELHEIM, 2002, p. 324).






REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDERSEM, Hans Christian. O Soldadinho de Chumbo.

BETTELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos Contos de Fadas. 16ª ed. [S.I.]: Paz e Terra, 2002.

CORSO, Diana; CORSO, Mário. A infância invade o conto de fadas. Zero Hora. Porto Alegre, 2 abr. 2005.

WIKIPÉDIA. Andersen: vida, história e literatura. Disponível em: Acesso em: out.2007.






sábado, 15 de setembro de 2007

A Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo-RS abordou o tema “A leitura da arte e a arte da leitura”.

Participei, na última semana do mês de agosto, da Jornada Literária de Passo Fundo-RS. E, para minha agradável surpresa, pude constatar um verdadeiro engajamento da comunidade acadêmica da Universidade de Passo Fundo UPF, personificado na Prof. Dra. Tânia Rössing, a favor da literatura brasileira.
Foram cinco dias de exposições de arte, encontros com escritores, espetáculos teatrais, palestras com escritores de vários países, autógrafos e muitos livros. Tudo isso em uma atmosfera mágica, primeiramente, porque o cenário desse evento é constituído de um circo, denominado Circo da Cultura, e é nele que acontecem a maioria das palestras, representa a sede de toda aquela estrutura fantástica. E segundo, pelo envolvimento de todos os participantes: professores, estudantes, jornalistas, leitores, intelectuais e amantes da literatura de diversas partes do mundo.
Paralelamente, ocorreram cursos, encontros de escritores com as crianças, entre as várias atividades que constituem a Jornadinha Literária. A Jornadinha constitui o espaço destinado ao encontro das crianças com o mundo da literatura. São armados vários circos, só que menores do que aquele que acolhe os adultos, e neles são abrigadas as crianças provenientes das escolas da região. Segundo informações contidas no site do evento, estima-se que participaram mais de 14 mil crianças.
Sob a coordenação do escritor Inácio de Loyola Brandão, do romancista e dramaturgo Alcione Araújo e do escritor, crítico e ensaísta Júlio Diniz, passaram pelo palco do Circo da Cultura, entre outros, Regina Zilberman, Mia Couto, Milton Hatoum, Miroslaw Bujko (Polônia),Ziraldo, Marina Colassanti,Elisa Lucinda e Lya Luft.
No encontro estadual de escritores, refletindo a “ Criação literária gaúcha” estiveram: Caio Ritter, Marcelo Carneiro da Cunha, Paula Mastroberti, Paulo Betancur,Alfredo Aquino, Cláudia Tajes, Juremir Machado da Silva,Paulo Ribeiro, Sérgio Capparelli, Daniel Galera, Fabrício Carpinejar, Letícia Wierzchowski,Moacyr Scliar,Charles Kiefer, Aldyr Schlee, José Clemente Pozenato, Kledir Ramil e Monique Revillion.
É, realmente, impossível não sair de lá, no mínimo, um pouco mais otimista com a situação da educação no Brasil. É a manifestação do trabalho de várias pessoas que ainda acreditam em um mundo melhor, que, por meio da literatura, promovem a arte, a arte de ler, de escrever, de inventar e de acreditar em mundo ficcional, que utiliza a realidade como desculpa para se fazer existir, e existindo põe em dúvida o que chamamos de realidade.



Nilson Régis, aluno do Curso de Letras/Português do Centro Universitário Metodista do Sul.