segunda-feira, 2 de março de 2009

IM INCLUIR PAR

Autor: Daniel Toffoli




A obra literária Ímpar aborda um tema delicado e que está presente na vida de muitos adolescentes, a deficiência física. Alguns destes jovens fazem parte das pessoas chamadas no livro de “ímpares”, ou seja, que têm alguma deficiência, seja por terem nascido com ela ou tenham adquirido por causa de uma doença ou em um acidente de trânsito. A grande maioria, os ditos normais, os “pares”, convivem ou conviveram com algum colega, amigo, parente, que apresenta alguma limitação desta natureza, por isso, é uma situação que diz respeito a todos nós.

Zóli perdeu seu braço em um acidente, estava com sua mãe que dirigia o carro, quando, um motorista embriagado, passou o sinal vermelho e os acertou em cheio. A mãe de Zóli sentia muita culpa pelo acidente e o ocorrido com o filho, mas estava consciente que dirigiu com cuidado, entretanto a culpa não era dela, e sim, do motorista. O acidente poderia ter sido evitado se aquele motorista irresponsável, não tivesse bebido a relação entre álcool e direção não combina. Assim, desde pequenos, os leitores prestarão atenção nesse aspecto, não se bebe quando se dirige, talvez alertem seus pais. Pode parecer que, apenas um parágrafo em um livro, não vai fazer diferença, mas, é um ótimo começo para divulgar esta idéia, juntamente com as campanhas feitas sobre o tema junto à comunidade e nos meios de comunicação vão reforçar esta boa conduta de que: bebida e direção não têm a ver.

Depois do acidente, Zóli se viu aleijado, palavra de tom pejorativo, mencionada pelo protagonista, que suscita incapacidade, inutilidade, ter uma deformação física, mas na verdade, o indivíduo, em muitos dos casos, apenas tem limitações, é muito diferente ser deficiente físico que supera suas limitações e está incluso na sociedade de um “aleijado” que se vê um coitadinho. Em um momento, Zóli não sabia se queria um braço artificial, ficou sem, o braço biônico, que alia a tecnologia ligada à praticidade ainda está em fase inicial.

Há aqueles que não se deixam abater e superam as adversidades, igualam ou até superam muitos daqueles ditos normais, na capacidade em desempenhar determinada atividade, função, ou mesmo em produtividade. A narração trata da superação como meio de incluir no mesmo universo, os “normais” e deficientes, cada um adquirindo seu espaço devido a seus méritos. Retrata o esforço de um menino em quebrar barreiras, de ir além do seu limite.

Ser aceito pelos “pares” é a conseqüência da demonstração pessoal de que se pode chegar muito além do que se imagina e que se lamentar é o mesmo que dizer que os outros são melhores do que ele e que sua existência é vã. Fica claro no livro que alguns não aceitam sua diferença e que olham torto, riem, debocham, entretanto, a força da vontade de vencer, juntamente com o apoio da família, fazem dele um campeão.

É fácil entender que, depois de uma perda, os primeiros momentos sejam difíceis, a pessoa já não é mais a mesma, ela deverá se adaptar ao mundo, terá a partir de então, uma nova relação com as pessoas, com as tarefas rotineiras como, no caso de Zóli: vestir-se, jogar tênis (esporte que tanto gostava de praticar) e como se comportar diante das pessoas (a aceitação de sua deficiência e limitações). O episódio que demonstra essa condição foi quando conversou em uma festa com Lisa, garota dita normal, uma supergarota. Ao falar com a ela, Zóli estava um pouco de lado, virado do lado do braço bom, sentia vergonha de mostrar que era um pouco diferente e, quando ela o convidou para dançar, não sabia o que fazer, mas foi salvo pela mãe da menina que a chamou para irem embora. Ele era muito jovem para saber lidar com tantas situações novas impostas pela vida, assim, de repente, era um pouco “diferente”, mas não por muito tempo, estava em processo de auto-aceitação e aprendizagem dos seus limites, como qualquer pessoa.

Em diversas passagens, são descritas situações que enfrenta um portador de deficiência física que está se adaptando à nova realidade, a transposição de barreiras emocionais, como a coragem de lutar para exigir seus direitos quando foram ao cinema, buscaram acesso livre a atividades culturais, de lazer, já que não possuía rampa ou a porta adaptada e fizeram uma manifestação. Essa coragem de lutar, que aprendeu com seus amigos deficientes, foi a mesma que o fez acreditar em seu potencial e participar da equipe de tênis da escola. Foram estes amigos que fizeram dele uma pessoa com a auto-estima, sua família estava do

seu lado, mesmo depois da crise emocional que passaram depois do acidente. Os amigos que muito lhe ajudaram foram: Bibiana, Pê, Máqui, Tula.

Um tema secundário abordado em Ímpar é o primeiro beijo de José Luiz, mais conhecido como Zóli. Essa descoberta é comum para a faixa etária dos adolescentes ou pré-adolescentes. Enquanto seus amigos demonstravam que, apesar da deficiência, ficavam, inclusive com pessoas “pares”, ele ainda não tinha beijado; se apaixonou por uma menina que se chamava Lisa, ela era “par”, mas entendia a situação de Zóli, principalmente quando se destacou e se classificou no campeonato de tênis. Foi quando ela veio perguntar se ele iria com alguma garota na festa de comemoração. Lá chegando, eles ficaram sozinhos e quando ela já estava pronta para beijá-lo, ele sai rapidamente, notou que não gostaria de estar ali naquele momento e que a supergarota era a Bibiana, aquela “ímpar” que, chateada, acabou ficando em casa. Zóli pegou um táxi e foi para casa da Bibi, foi lá que deram o primeiro beijo.

A história é fascinante, é escrita em linguagem acessível ao público infanto-juvenil, com elementos conhecidos por estes, como: ICQ, programa que trabalha on-line em que dois ou mais usuários se comunicam em tempo real, trocam mensagens e arquivos; Mac Donald's, rede de lanches fast food muito frequentada por essa faixa etária ; Cinemark, rede de cinemas; escola; festa e ônibus adaptado( alguns avanços já foram alcançados para uma maior inclusão). Palavras e expressões coloquiais, da fala, como: “A gente não é uma galera?”; “doeu pra caramba”, “...mas nada de mico.”; “...ela ficou muuuito brava.” promovem a identificação do público leitor.

O livro é ilustrado, quem olha rapidamente pensa estar vendo o mesmo desenho no começo de cada capítulo, mas o ilustrador optou por alternar os personagens em cada um deles. O tamanho de letra é grande se comparado com livros técnicos, por exemplo.

A presença de diálogos no texto reproduzem a linguagem informal do adolescente e proporcionam um ritmo dinâmico à narrativa. As frases, em geral, são apresentadas na ordem direta: sujeito, verbo, complemento e oração principal e subordinada na ordem adequada. Segundo Schopenhauer (2005), as orações subordinadas interrompem a idéia original, dão um aspecto prolixo ao texto, se interrompe a frase para colocar uma outra no meio. Da maneira como o texto foi escrito, a fluidez é mantida e, conseqüentemente, o interesse do jovem leitor pelo enredo. O encadeamento linear das ações e idéias, as breves descrições e a ausência de reflexões profundas, faz deste, um texto adequado ao público infanto-juvenil.

O narrador da história é narrador-personagem e protagonista, conta uma história vivida por ele, com suas impressões, sensações e sentimentos à respeito dos acontecimentos. É um livro atual, aborda o tema do transplante de medula, da forma que o adolescente entenda. Relata das dificuldades da Bibiana, que tem um problema para andar, o osso da perna que encaixa na bacia dói quando ela anda, mas tem possibilidade de fazer uma cirurgia. Com esse exemplo, podemos entender um pouco como estas pessoas fazem, a partir de uma limitação, a superação diária, mesmo que tenham que suportar a dor.

O Humor está presente em alguns trechos, há uma brincadeira com a questão da deficiência, porém de uma forma sutil, visto que, o politicamente correto, é a ditadura do comportamento (dito na mídia), há momentos que todos precisamos descontrair.

Depois do acidente Zóli tinha parado de ler um livro que tinha um pirata da perna de pau, ele era “ímpar”, a história era meio de assustar, mas ele era bem legal. Começava cada vez a se aceitar mais, até ajudou em casa com as tarefas domésticas.

Ímpar é um livro singular ao tratar com tanta delicadeza e otimismo a questão da deficiência física, ele indica soluções, acalenta corações tempestuosos pelo desespero do que não se pode mais.

REFERÊNCIAS


D'ONÓFRIO, Salvatore. Teoria do Texto 1. 2. ed. São Paulo:Ática, 2006.

SCHOPENHAUER, Arthur. A arte de escrever. Porto Alegre: L&PM, 2005.

TECNOLOGIA. Disponível em:
Acesso em: 13/11/2008.

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